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A ascensão das fintechs na democratização do crédito

A ascensão das fintechs na democratização do crédito

21/05/2025 - 08:27
Matheus Moraes
A ascensão das fintechs na democratização do crédito

No cenário financeiro brasileiro, o acesso ao crédito sempre esteve associado a altas taxas de juros e burocracia extensa e a concentração de poder em grandes instituições. Historicamente, cinco grandes bancos dominavam a concessão de recursos, limitando oportunidades para muitos indivíduos e empreendedores. Essa dinâmica reforçou desigualdades, deixando parcelas significativas da população sem capacidade de investimento ou capital de giro.

Nos últimos anos, porém, a emergência das fintechs provocou uma verdadeira revolução. Com modelos de negócio ágeis, foco em tecnologia e propostas centradas no cliente, essas empresas têm conseguido desburocratizar processos e oferecer soluções personalizadas. Mais do que um simples movimento de mercado, trata-se de uma mudança profunda na forma como o crédito é disponibilizado.

Contexto histórico e barreiras tradicionais

Desde a década de 1990, o sistema bancário nacional passou por fases de consolidação, fusões e ampliação de serviços. Apesar do crescimento econômico em diferentes ciclos, o modelo de oferta de crédito permaneceu conservador, com avaliações baseadas em histórico bancário e garantias reais. Como resultado, pequenos empreendedores, autônomos e consumidores sem cadastro formal foram frequentemente excluídos.

Esse cenário se manteve até a segunda década do século XXI, quando a mobilidade digital e mudanças regulatórias começaram a abrir espaço para novos entrantes. A criação de ambientes virtuais de atendimento e a expansão do uso de dados alternativos foram fundamentais para reduzir barreiras de entrada e acelerar a inovação.

A dificuldade de acesso ao crédito tradicional afetava igualmente iniciativas de crédito rural e microfinanças, que buscavam atender populações de baixa renda em áreas remotas. Apesar de programas públicos e linhas especiais criadas pelo governo, a burocracia e a falta de infraestrutura tecnológica ainda eram entraves. Com o avanço da internet e a popularização dos smartphones, novas empresas enxergaram uma oportunidade de criar soluções mais acessíveis e ágeis, estabelecendo parcerias estratégicas com mercados locais e comunidades.

Inovação, agilidade e personalização

As fintechs se diferenciam por adotar tecnologias disruptivas e novos modelos de negócio, resultando em processos mais eficientes e experiências mais atraentes. Ao combinar plataformas digitais com inteligência artificial, as empresas conseguem avaliar riscos em tempo real e oferecer crédito sob medida para cada perfil.

Principais vantagens oferecidas pelas fintechs:

  • taxas de juros mais competitivas: o cartão de crédito rotativo de algumas fintechs tem juros médios de 242,4% ao ano, em comparação com a média nacional de 440,8%.
  • processos simplificados e menos burocráticos: análise rápida de documentos e resposta em minutos, sem a necessidade de garantias complexas.
  • Plataformas digitais que facilitam o acesso, mesmo para clientes sem histórico bancário tradicional.

Plataformas como Nubank, Creditas e Geru ilustram bem essa transformação. Utilizando chatbots, scoring alternativo baseado em dados de consumo e análise de comportamento online, essas empresas conseguem propor linhas de crédito com prazos e valores ajustados à realidade do cliente. Além disso, o uso de biometria e validação digital torna o processo mais seguro e confiável.

Crescimento acelerado e números do mercado

O mercado de crédito das fintechs no Brasil passou por um crescimento impressionante. Entre 2022 e 2023, a base de clientes pessoa física saltou 82%, saindo de 25,6 milhões para 46,7 milhões de usuários. No mesmo período, o volume de crédito concedido cresceu 52%, atingindo R$ 21,1 bilhões.

Além disso, o número de fintechs autorizadas pelo Banco Central como Sociedades de Crédito Direto (SCD) ou de Empréstimo entre Pessoas (SEP) saltou de 11% em 2019 para 46% em 2023, demonstrando maturidade regulatória e confiança do mercado.

Comparativo de taxas de juros (média anual):

No contexto latino-americano, o Brasil se destaca como o maior mercado de fintechs, com mais de 830 startups registradas em 2024. Estima-se que, até 2025, as fintechs representarão cerca de 10% do total de crédito ao consumidor no país, elevando ainda mais sua participação de mercado e pressionando os bancos tradicionais a reduzirem taxas e melhorarem serviços.

Impacto social: democratização e inclusão financeira

Um dos maiores impactos das fintechs é a inclusão de públicos historicamente excluídos do sistema de crédito. Mais de 68 milhões de brasileiros estavam negativados em 2024, representando cerca de 40% da população adulta. As fintechs desenvolveram soluções específicas para esse público, promovendo crédito mais acessível para trabalhadores de baixa renda, autônomos, microempreendedores e negativados.

Entre as soluções mais inovadoras estão a antecipação de FGTS, o microcrédito para pequenos negócios e operações baseadas em dados alternativos que vão além das garantias tradicionais. Essas iniciativas têm contribuído para a recuperação financeira e para a manutenção de atividades empresariais em tempos de crise.

O impacto social também se reflete em comunidades periféricas, onde a falta de agências bancárias físicas encarece serviços. Fintechs regionais têm desenvolvido modelos de negócio de base comunitária, treinando agentes locais para operacionalizar empréstimos e educação financeira. Essas ações promovem, simultaneamente, inclusão e desenvolvimento local.

Open Finance e o poder dos dados

O advento do Open Finance abriu novas possibilidades para o compartilhamento de dados financeiros de forma segura e consentida. Até outubro de 2024, eram registrados 37 milhões de consentimentos únicos ativos, um crescimento de 35% em relação ao ano anterior.

Em testes práticos, 84% dos clientes inicialmente negados conseguiram novas ofertas de crédito, e 63% tiveram seus pedidos aprovados após a análise de dados alternativos. Utilizando análise preditiva e big data, as fintechs conseguem personalizar propostas e reduzir significativamente as taxas de inadimplência.

A interoperabilidade proporcionada pelo Open Finance permite que consumidores agreguem dados de contas, investimentos e empréstimos em uma única interface. Essa visão integrada favorece a análise de perfil completo, possibilitando ofertas que combinam crédito pessoal, consignado e até seguros, tudo de forma simplificada.

Diversificação de modelos e evolução regulatória

Com a regulamentação de diferentes formatos de instituição de crédito, o mercado tem se diversificado rapidamente. Atualmente, existem:

  • Correspondentes bancários digitais;
  • Sociedades de Crédito Direto (SCD) e de Empréstimo entre Pessoas (SEP);
  • Instituições de Pagamento e Sociedades de Crédito, Financiamento e Investimento (SCFIs).

Quase metade das fintechs já possui licença do Banco Central, enquanto outras 8% aguardam autorização, indicando um ambiente maduro e em constante evolução.

Em 2023, o Banco Central lançou novas regulamentações para as Sociedades de Crédito, Financiamento e Investimento (SCFI), ampliando os limites de atuação e incentivando a criação de fundos de investimento especializados em crédito alternativo. Essa regulação cria um ambiente mais claro para investimentos institucionais no setor, fortalecendo o ecossistema.

Desafios e limites

Apesar do avanço acelerado, o volume de crédito das fintechs ainda representa uma fração do total concedido pelos bancos tradicionais, especialmente para grandes empresas. A Selic em 13,75% ao ano durante 2023 impôs desafios de rentabilidade e exigiu ajustes em modelos de negócio para manter a sustentabilidade.

Adicionalmente, a gestão de risco e a manutenção de baixos índices de inadimplência dependem da qualidade dos dados e de políticas claras de cobrança. A educação financeira do público também se mostra fundamental para evitar o superendividamento.

A escalabilidade dos modelos de negócio ainda enfrenta desafios técnicos, como a integração com sistemas legados de instituições parceiras e a necessidade de infraestrutura robusta para o processamento de grandes volumes de dados em tempo real. Questões de segurança cibernética e conformidade regulatória são pontos críticos que exigem investimentos contínuos em tecnologia e profissionais qualificados.

Perspectivas futuras e tendências

A tendência é que o setor de fintechs continue crescendo, impulsionado pelo Open Finance, pela inteligência artificial e por novos nichos de mercado. A médio prazo, espera-se uma maior desconcentração bancária, com mais opções de crédito e serviços financeiros para todos os perfis de clientes.

Os pilares dessa transformação incluem:

  • Inovação tecnológica constante;
  • Redução de custos operacionais;
  • Ampliação do acesso ao crédito;
  • Foco em segmentos negligenciados;
  • Parcerias entre fintechs e instituições tradicionais.

Esse ecossistema, cada vez mais diversificado, promete não apenas democratizar e amplificar o acesso ao crédito, mas também modernizar a economia brasileira como um todo, abrindo espaço para crescimento sustentável e inclusão social.

No horizonte, tecnologias emergentes como blockchain podem ser incorporadas às operações de crédito para garantir transparência e rastreabilidade em todas as etapas. O uso de contratos inteligentes (smart contracts) pode automatizar a liberação de recursos e reduzir intermediários, acelerando ainda mais o processo.

Além disso, a inteligência artificial generativa promete revolucionar o atendimento ao cliente, criando assistentes virtuais capazes de orientar o usuário em todas as fases do ciclo de crédito, desde a simulação até o pagamento. Essas soluções devem elevar os níveis de satisfação e fidelização, consolidando a presença das fintechs no mercado.

Matheus Moraes

Sobre o Autor: Matheus Moraes

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